Estava ali parado, quieto, observando a briga dentro da casa. Barulhos estranhos surgiam a todo momento, mas ele não compreendia qual era o problema. Ouviu seu nome. Ele entrou na casa mais que depressa e percebeu que a casa já não estava como antes, cacos de vidro por todo lado e sangue espalhado pelo chão. Alguns móveis estavam quebrados e outros apenas fora do lugar. Ouviu novamente gritos e encontrou Laura ali, deitada entre os cacos de vidro. O sangue vinha dela. Ao se aproximar dela, a viu sorrir, um sorriso melancólico, como se fosse o ultimo que ela daria.
Ficou observando por alguns instantes o sorriso de Laura ao vê-lo, ela estava feliz com a sua presença, ele se aproximou e ela mandou que se afastasse. Ao se afastar ela gritou novamente, era um grito de dor e só então ele percebeu a presença de Gustavo ali, com uma cadeira em suas mãos ameaçando Laura.
Ele não entendeu, nunca tinha visto aquilo. Os dois eram sempre carinhosos com ele e entre eles também. Sempre abraçados, trocando caricias e beijos, mas desta vez não havia amor ali. Apenas ódio. O olhar de Gustavo estava diferente, algo que ele nunca vira antes. Era um olhar doentio, de quem tinha ódio e vontade de matar.
Entrou em desespero. Laura não deixava ele se aproximar, mas ele não poderia ficar escondido vendo-a morrer. Ele precisava agir, mas como?
Saiu pela porta da frente que estava aberta e deu a volta na casa. No meio do caminho Laura gritou novamente. E desta vez mais alto, um grito mais sofrido, seguido de um barulho ensurdecedor.
Voltou correndo pela porta da frente e desta vez havia pedaços de cadeira envolta de Laura. Chegou mais perto e ouviu Gustavo gritando e batendo no corpo dela. Não podia ver aquilo sem fazer nada. Laura estava ferida e Gustavo parecia querer feri-la mais. Enquanto sentia os tapas de Gustavo, Laura olhou para ele novamente, estampou aquele mesmo sorriso e fechou os olhos. Gustavo levantou e saiu bufando pela porta da frente.
Ele se aproximou de Laura, ela ainda sorria, mas seus olhos estavam fechados. Ele a cheirou, cutucou com seu focinho e lambeu seu rosto, mas Laura não abria os olhos. Começou a sentir agonia. Deitou ali, ao lado de Laura e lá ficou durante alguns minutos até que Laura abriu os olhos novamente com muito esforço. Ele se levantou para olhá-la. Ela sorriu e tentou lhe fazer carinho com as mãos ensangüentadas. Beijou seu rosto e sussurrou com muito esforço um "eu te amo".
Mais uma vez seus olhos se fecharam, mas desta vez o sorriso desapareceu.
Ele se deitou novamente ao lado de Laura e ficou desta vez durante horas e nada. Laura havia partido. E a última visão que tivera fora de seu cachorro ali, mais fiel que nunca, lhe fazendo companhia enquanto ela ia embora.
Nossa, que texto lindo Flavinha. Muito perspicaz essa sua proposta do personagem ser desnudado, pouco a pouco. Quando ele entra e vê Laura no chão e vê o Gustavo voltar para agredi-la, fiquei agoniada, fui acompanhando a história pensando: o que ele fará? Por que o agressor não o vê? Não reage contra ele? Então descubro que é um cão e percebo a consistência e a fragilidade daquela presença que se tornou a última companhia de Laura. Adorei!Estou gostando cada vez mais dos seus escritos. Beijinhos.
ResponderExcluirGostei muito do seu conto, fiquei intrigada até o fim com aquela imagem sem reação de quem estava vendo aquela cena.
ResponderExcluirEscreva mais. Beijo