quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Como um rio

A minha vida é como um rio. A água está sempre corrente, não importa se calma ou agitada. O estado da água depende dos seres que vivem nela, ou seja, das pessoas presentes.
No rio existem pedrinhas, aquelas que estão lá no fundo, que podem não parecer mas estão ali presentes. Existem também as algas que alimentam os peixes, aqueles que fortalecem a permanência de outros através de seus erros. Os peixes? Esses são aqueles que vivem no rio e fazem dele o mais bonito e colorido, aqueles que estão sempre ali pra manter o curso do rio, sempre em frente. Além dos habitantes há também a margem. Aquela que dá limites ao rio e não permite que ele tome outro rumo, como uma mãe. Na margem existe a vegetação que contribui para que não haja danos à margem, como uma família. E como todo rio, esse desagua em um mar. Chega a um ponto em que há um divisor de águas que faz com que a água doce vire salgada. É como um anjo que faz o que era doce e calmo virar salgado e agitado. Os peixes que vão para o mar não conseguem voltar, assim como as algas e as pedras. Depois do divisor de águas não há volta.
O rio passa por períodos de grandes tempestades e períodos de seca. Na seca, há menos água, menos peixes, a terra da margem fica seca e sensível, há menos algas. Já nas tempestades, há menos peixes, mais água, mais pedras, mais algas, a margem fica molhada e frágil, mais forte fica a correnteza, fazendo com que tudo caia no mar mais rápido. Mas entre os períodos de secas e tempestades há o período de calmaria, quanto estabiliza o número de algas, peixes e pedras, quando a margem fica firme, a vegetação mais bonita e a correnteza regular.
Mas uma coisa é certeza, não importa a época, o divisor de águas está sempre lá para fazer o que já não merece estar no rio ir pro mar e ficar no passado.

domingo, 15 de agosto de 2010

Crônica do amor

Ninguém ama outra pessoa pelas qualidades que ela tem, caso contrário os honestos, simpáticos e não fumantes teriam uma fila de pretendentes batendo a porta.
O amor não é chegado a fazer contas, não obedece à razão. O verdadeiro amor acontece por empatia, por magnetismo, por conjunção estelar.
Ninguém ama outra pessoa porque ela é educada, veste-se bem e é fã do Caetano. Isso são só referenciais.
Ama-se pelo cheiro, pelo mistério, pela paz que o outro lhe dá, ou pelo tormento que provoca.
Ama-se pelo tom de voz, pela maneira que os olhos piscam, pela fragilidade que se revela quando menos se espera.
Você ama aquela petulante. Você escreveu dúzias de cartas que ela não respondeu, você deu flores que ela deixou a seco.
Você gosta de rock e ela de chorinho, você gosta de praia e ela tem alergia a sol, você abomina Natal e ela detesta o Ano Novo, nem no
ódio vocês combinam. Então?
Então, que ela tem um jeito de sorrir que o deixa imobilizado, o beijo dela é mais viciante do que LSD, você adora brigar com ela e ela adora implicar com você. Isso tem nome.
Você ama aquele cafajeste. Ele diz que vai e não liga, ele veste o primeiro trapo que encontra no armário. Ele não emplaca uma semana nos empregos, está sempre duro, e é meio galinha. Ele não tem a
menor vocação para príncipe encantado e ainda assim você não consegue despachá-lo.
Quando a mão dele toca na sua nuca, você derrete feito manteiga. Ele toca gaita na boca, adora animais e escreve poemas. Por que você ama
este cara?
Não pergunte pra mim; você é inteligente. Lê livros, revistas, jornais. Gosta dos filmes dos irmãos Coen e do Robert Altman, mas sabe que uma boa comédia romântica também tem seu valor.
É bonita. Seu cabelo nasceu para ser sacudido num comercial de xampu e seu corpo tem todas as curvas no lugar. Independente, emprego fixo, bom saldo no banco. Gosta de viajar, de música, tem loucura
por computador e seu fettucine ao pesto é imbatível.
Você tem bom humor, não pega no pé de ninguém e adora sexo. Com um currículo desse, criatura, por que está sem um amor?
Ah, o amor, essa raposa. Quem dera o amor não fosse um sentimento, mas uma equação matemática: eu linda + você inteligente = dois apaixonados.
Não funciona assim.
Amar não requer conhecimento prévio nem consulta ao SPC. Ama-se justamente pelo que o Amor tem de indefinível.
Honestos existem aos milhares, generosos têm às pencas, bons motoristas e bons pais de família, tá assim, ó!
Mas ninguém consegue ser do jeito que o amor da sua vida é! Pense nisso. Pedir é a maneira mais eficaz de merecer. É a contingência maior de quem precisa.

Arnaldo Jabor